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A saúde na F1 frente ao desgaste físico e mental

  • Foto do escritor: Monique Mavillyn
    Monique Mavillyn
  • 3 de out. de 2022
  • 6 min de leitura

Atualizado: 9 de jun. de 2023

Dino Altmann analisa os impactos de agora e a longo prazo com o aumento dos Grandes Prêmios.


Dino Altmann (Foto: Sergio Barzaghi/Gazeta Press)

Na tarde de uma sexta-feira, diretamente do carro médico da Stock Car, tive o privilégio de conversar com Dino Altmann, o Diretor Médico do GP São Paulo de Fórmula 1 desde 2001. Ele compartilhou conosco sua visão sobre as possíveis consequências para todos os envolvidos na categoria diante das 24 corridas previstas para o próximo ano.


Com uma história que se entrelaça ao automobilismo há décadas, Dino Altmann é uma referência no automobilismo. Antes mesmo de começar a participar da etapa brasileira em 1990, Altmann viveu sua paixão pelo esporte a motor como piloto de kart por quinze anos. Paralelamente, seu coração também pulsava pelo campo da medicina.


Embora tenha alcançado cargos de grande importância no automobilismo, como o de responsável médico pelo atendimento de emergência no Campeonato Brasileiro de Stock Car e Porsche GT3 Cup Brasil, Diretor Médico do GP do Brasil de Fórmula 1 e, em 2021, assumindo a posição de Presidente da Comissão Médica da FIA (Federação Internacional de Automobilismo) e da Comissão Médica da CBA (Confederação Brasileira de Automobilismo), Dino não dedica todo o seu tempo ao mundo da velocidade. Como especialista em cirurgia oncológica e do aparelho digestivo, em alguns dias da semana o médico está do outro lado, no Hospital Albert Einstein.


Ele na F1 🏎

Faltando um pouco mais de um mês para o GP do Brasil, o carro médico segue sem o comando de Altmann. “Hoje fico no Race Control, onde fica o diretor de cada equipe, toda à parte da diretoria está ali para tomar decisões juntas. Então eu organizo e treino toda equipe. Fico na sala de controle, infelizmente, porque prefiro estar mais na pista.” disse ele humorado.


Falando de dentro do carro médico da Stock Car, perguntei qual era a sensação ao ser acionado para entrar na pista e presenciar a adrenalina do momento.


Sinto que é o comprimento da minha função. Sempre esperamos que não tenha nada mais grave, mas também sempre estamos preparados para o que tiver. Tem que ter uma atenção bem grande, estar atento à cena do acidente, saber como parar o carro para proteger a cena. Não podemos ficar em risco, porque se não são dois problemas. Há toda uma abordagem a ser feita que precisa de muita atenção. Isso com o tempo gera pouco estresse, mas é até interessante que aconteça, porque você consegue ter mais atenção se há uma pequena manifestação de estresse. Isso deixa todas as suas funções mais rápidas. Na situação de estresse você está preparado mesmo. É como pensar em um animal em situação de estresse, ele está preparado para fugir, aqui nós estamos preparados para atuar. E temos uma visão mais geral da situação toda. Mas é bom.

Tendo acompanhado de perto a trajetória da F1 e a interferência de seu ritmo na vida daqueles que estão no esporte, Altmann conta que ao chegar no local do Grande Prêmio, as equipes fazem um check-up geral e, dentre todos funcionários, há um número enorme de pessoas no centro médico que apresentam desgastes físicos e mentais.


Nesse estresse emocional e físico - devido ao cansaço -, alguns recorrem a drogas para conseguir se manter ativo, ainda mais quando o intervalo de um GP para outro é pequeno, isso se tiver, porque ocorre de termos semanas com GPs seguidos. Com tantas corridas, eles acabam recorrendo à uma fuga.

Zoom na rotina 🔍

O engenheiro sênior de sistemas da RBR, Daniel Drury, fez uma publicação nas redes sociais comentando sobre a rotina e, especialmente, quando um GP fica longe do outro e a corrida é a próxima, como acontece na sequência GP Brasil e Abu Dhabi.


Daniel explica que o trabalho começa na segunda-feira da semana da corrida e, em casos de rodadas duplas ou triplas, se estende por mais sete dias que chegam a 14 horas diárias de trabalho para mecânicos e engenheiros. Diferentemente dos pilotos, chefes e convidados que começam a chegar nos paddocks na quarta ou quinta-feira.


“Na segunda-feira voamos para o local do evento, geralmente chegamos ao hotel à noite depois de perder um bom tempo com aluguel de carros, bagagem e etc. Dependendo do horário, talvez você consiga sair pela área para um jantar tardio. Caso contrário, você fica com o que conseguiu comer no voo ou no aeroporto. De terça para quarta isso não altera muito, em um dia de trabalho que dura cerca de 12h, só é possível comer no hotel e, depois, almoçar com o que é fornecido pelos organizadores dos circuitos.” diz Drury.


O engenheiro fala ainda que a parte mais difícil é no domingo “É agora que começa a diversão: sabe aquela garagem que você construiu em dois dias? Precisa limpá-la em 4 horas, ter tudo empacotado e pronto para ir para o próximo evento.”


Até aqui deve ter notado que o glamour passa um pouco longe da realidade de muitos ali dentro. Mas, é claro que apesar de levarem essa rotina, amam o que fazem. Assim como Dino.


“Eu cheguei a cobrir 30 corridas por ano, você viaja quase toda semana. Precisa ter um preparo para aguentar, mas eu sempre lidei muito bem com isso, fiz esporte a vida inteira, então se eu não gostasse, eu não estaria aqui, ainda mais depois de tanto tempo.”


Qual será o preço?

De fato, o aumento confirmado pela FIA no número de corridas traz consigo algumas influências negativas. Além das questões relacionadas ao desempenho físico dos pilotos, que precisam de tempo para treinar e que se torna ainda mais desgastante ao longo da temporada com intervalos curtos, há também o peso da cobrança dos patrocinadores, que direcionam sua atenção aos resultados. Podemos observar que essa expansão no calendário acarreta desafios adicionais para os pilotos. O condicionamento físico e mental exigido para competir em tantas corridas seguidas é imenso, e o tempo disponível para treinamento e recuperação se torna cada vez mais escasso. O equilíbrio entre o desgaste físico e a necessidade de alcançar bons resultados torna-se uma tarefa árdua.


Além disso, há também a pressão dos patrocinadores, que investem pesadamente nas equipes e esperam resultados consistentes. Com um calendário mais apertado, as expectativas e a cobrança por desempenho se intensificam. Os pilotos precisam lidar com a responsabilidade de atender às demandas de seus patrocinadores, o que pode adicionar uma carga adicional de estresse. “Tudo isso gera um estresse no piloto e, consequentemente, em toda equipe." afirma Altmann.


Claro que a demanda para fazer um treinamento com todos será maior, porque irá exigir mais. Outro fato também não só para equipe, mas agora focado no piloto, é que seu trabalho físico e mental deve ser muito disciplinado, bem como o seu condicionamento nutricional. Concluiu.

Nesse aspecto, cabe apontar que com mais corridas por ano, maiores serão os gastos por equipe. E é aí que temos um parafuso fora do lugar: a cada temporada o teto orçamentário reduz 5 milhões de dólares. Então, como será encaixar todas essas demandas em 24 Grandes Prêmios ao redor das Américas, Europa e Oriente? Pensando a longo prazo, se persistir o aumento de corridas ou até mesmo se mantiverem as 24, a logística torna-se ainda mais complexa.


O que vai acontecer é que o número de pessoas dentro da equipe deve aumentar, para que seja possível fazer um rodízio nos GPs, como acontece na Indy, mas isso significa ter um gasto maior. E outra, você verá um cenário ainda mais estressante e com uma maior probabilidade de problemas auditivos, já que eles estão expostos ao barulho por mais vezes. Com certeza isso vai acontecer. Explica Altmann.

Uma parada precoce?

Se há um esforço maior, há um desgaste maior, consequentemente, manter o mesmo ritmo por anos pode ser exaustivo. Sendo assim, é provável que isso possa acelerar a questão da aposentadoria de alguns pilotos, já que temos uma maior probabilidade do surgimento de problemas de saúde causados pelo alto desgaste mental e físico. No entanto, isso não ficará evidente até que as equipes ou os próprios pilotos se manifestem apresentando o real motivo.


De modo geral, o acréscimo de corridas apresenta prós e contras. Para o engenheiro da Williams Racing, Ernesto Desiderio, ainda há uma mistura de sentimentos “Animado ou assustado?” disse ele nas redes sociais.


Em sua visão, os prós são:

- Muitas oportunidades para fazer bem

- Muitos grandes eventos e pistas de corrida

- Uma tonelada de tempo gasta fazendo um trabalho que amamos


Enquanto que os contras:

- Tempo longe da família

- Tempo longe dos amigos

- O tempo longe de uma vida normal


E acrescenta “Depende de quem você perguntar, os prós e os contras serão diferentes, tenho certeza que para muitas pessoas ter mais corridas é uma grande vantagem, eu também amo o esporte! Às vezes, embora, tenhamos que lembrar que há muitas pessoas envolvidas e muitas mais afetadas pelos calendários de F1, sua saúde mental e física vem antes dos lucros! Felizmente, algumas equipes de F1 entenderam isso e estão tomando medidas para facilitar nossas vidas! 💙”

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