F1 Academy, Drive to Survive e público feminino: o que tem feito a audiência da Fórmula 1 mudar tanto nos últimos anos?
- Giovanna Carvalho

- 20 de jan.
- 6 min de leitura
Atualizado: 21 de jan.
Por muito tempo, o automobilismo foi um território que parecia falar apenas a língua dos homens. E não por falta de interesse das mulheres, mas por convenções culturais e um histórico de machismo. Gostar de motores, de engenharia e da adrenalina de uma corrida parecia pertencer ao mundo deles, enquanto aquelas que se aventuravam nesse meio enfrentavam olhares de descrença — quase como se estivessem falando em grego. ou nem soubessem sobre o que estavam falando.
Ainda sim, elas sempre estiveram lá. Em 1958, Maria Teresa de Filippis abriu caminho ao se tornar a primeira mulher a competir na Fórmula 1. Décadas depois, Susie Wolff ganhou destaque como piloto de testes da Williams, sendo uma das figuras mais inspiradoras para mulheres que sonhavam com a elite do automobilismo.

Mas foi a partir de 2017, quando a Liberty Media adquiriu os direitos da Fórmula 1, que a presença feminina começou a ser mais transparente. A visão da empresa não se limitava apenas à ampliação da audiência, mas também à reinvenção da forma como o esporte era consumido — mais acessível, mais entretenimento e, sobretudo, mais lucro. Projetos como a série "Drive to Survive", lançada pela Netflix, não só aproximaram os fãs da realidade dos bastidores, como também mudou completamente a imagem da F1.
À medida que as novas gerações passaram a ver as corridas sob outra ótica, o público feminino aumentou exponencialmente. O estudo da Nielsen Sports indica que cerca de 41% dos fãs da F1 são mulheres. um número que reflete a crescente diversificação do público, impulsionada também pelo surgimento da F1 Academy, a categoria dedicada ao desenvolvimento de pilotos exclusivamente femininas.
Hoje, mulheres como Aurelia Nobels e Rafaela Ferreira, pilotos brasileiras da F1 Academy, são a prova de que a mudança não é mais uma questão de 'se', mas de 'quando'. Elas seguem os passos de suas antecessoras, como Maria Teresa de Filippis e Susie Wolff, e agora têm um palco próprio para mostrar seu talento.
Entre tapas e beijos: Drive to Survive

Lançada em 2019, a série documental da Netflix, “Fórmula 1: Drive to Survive”, é um tema quente, para não se dizer polêmico, entre os amantes de gerações diferentes da categoria. O plano da produção era conseguir atrair uma audiência mais global ao expor o outro lado da moeda do esporte, focando nos bastidores e entornos das corridas, além de construir a narrativa em relatos de pilotos e membros da equipe, contando também com a participação dos jornalistas que fazem parte da F1.
O sucesso abre espaço para o falatório. Alguns entusiastas não aprovam a série, afirmando que existe uma “dramatização em excesso” ou uma “manipulação da realidade dos fatos” para gerar mais audiência, criando histórias “falsas” em cima dos Grandes Prêmios. E isso não vem muito só de quem estava do lado de fora, alguns dos próprios pilotos também já mostraram insatisfação com a produção.
Quem não se lembra de quando o tetracampeão Max Verstappen deixou de participar das gravações por acreditar na distorção e encenação exagerada dos fatos. Ele também comenta que a série pode formar uma impressão equivocada sobre os pilotos para aqueles que não acompanham a categoria fora dessa base midiática.

Nessa linha de raciocínio, criou-se a “geração DTS”, termo muito utilizado para endereçar os fãs pós-seriado de maneira negativa, principalmente jovens e mulheres. Apesar disso, os números não mentem. Desde a estreia da série, o público cresceu em 5,7% no mundo todo, fazendo com que a Fórmula 1 atingisse cerca de 1 bilhão de espectadores - pouca coisa né? - e dobrando o engajamento da categoria nas redes sociais.
Zak Brown, CEO da McLaren, disse que se surpreendeu com sua ascensão: “Tem sido um sucesso real para a F1. Se fosse apenas uma série sobre carros em uma pista, talvez não fosse um sucesso, mas quando você entra na política, nas mudanças, nas rivalidades… E é sempre isso que está acontecendo, não vejo razão para não poder continuar por muito tempo”.
Acha que acabou? A sétima temporada chega à Netflix no dia 7 de março e, desta vez, com uma promessa: uma versão da série voltada para a F1 Academy deve chegar ao streaming na mesma época.
Garotas pilotam por aqui!
Susie Wolff, diretora administrativa da F1 Academy, falou sobre a produção “a là” drive to survive: “Queremos ser o combustível do foguete que impulsiona a participação feminina em nosso esporte, tanto dentro quanto fora da pista. O lançamento global da série documental da F1 Academy com a Netflix não é apenas um grande passo à frente na visibilidade de nossa missão, mas também uma declaração retumbante sobre o impulso e a demanda pelo esporte feminino. Queremos inspirar e capacitar a próxima geração de mulheres jovens e a Netflix abrirá a F1 Academy para um público global de fãs atuais e futuros”.

Com sua temporada de estreia em 2023, a F1 Academy é uma competição de corridas exclusivamente femininas, criada para impulsionar a carreira de jovens pilotos e prepará-las para categorias maiores do automobilismo. Cada uma das dez equipes da Fórmula 1 patrocina uma das competidoras do grid da F1 Academy, integrando seus projetos nas academias de pilotos e estampando seus carros. Além disso, 15 mulheres competem ao todo, sendo que as cinco restantes representam marcas parceiras, como PUMA, Tommy Hilfiger e até Charlotte Tilbury, a primeira marca de maquiagem a patrocinar um campeonato de corridas, o que ajuda a expandir a categoria além do automobilismo.
O objetivo de muitas das garotas no grid é claro: chegar à Fórmula 1, mas a F1 Academy também abre portas para outras categorias. A primeira campeã de sua história, Marta Garcia, agora corre na FRECA (Fórmula Regional Europeia) com a equipe Iron Dames, enquanto a campeã da última temporada, Abbi Pulling, segue para o campeonato britânico GB3.
Vale lembrar que a última mulher a competir e pontuar na Fórmula 1 foi Lella Lombardi, em 1975. Com a F1 Academy, essas jovens pilotos sonham em quebrar esse jejum histórico – será que logo veremos uma delas no grid da F1? 👀
Em 2025, a F1 Academy terá sete rodadas em locais icônicos como Shanghai, Jeddah, Miami, Montreal, Zandvoort, Singapura e Las Vegas – todas como “support races” durante os fins de semana da Fórmula 1.
Além de ser uma excelente oportunidade para apoiar o automobilismo feminino, a F1 Academy também tem algo a mais: brasileiras no grid! Até a temporada passada, a nossa representante era Aurélia Nobels, piloto da PUMA, mas em 2025, Rafaela Ferreira se junta a ela, agora pela VISA RB.
Fala sério, já é motivo o suficiente para começar a acompanhar a categoria, não?
FIA GoT e o sonho de trabalhar no automobilismo
Além da própria F1 Academy e da série Drive to Survive, existem outros projetos que visam promover maior equilíbrio na audiência da Fórmula 1, como por exemplo, o FIA Girls on Track, que promove experiências para jovens mulheres que buscam trabalhar com automobilismo. As ações vão desde palestras educacionais até visitas em Grandes Prêmios e acontecem no mundo todo.
Com iniciativas assim, o esporte se torna cada vez mais diversificado e um espaço que era antes indiscutivelmente masculino, começa a ter uma flexibilidade para mulheres que chegam aos montes no mundo do automobilismos: “Quando eu corria e era bem nova, eu não tinha muito em quem me inspirar além da Danica Patrick, que corria a NASCAR, e também a Susie, mas eu não tinha muitas inspirações como uma garota… Eu acho que agora é muito bom, porque com a F1 Academy existem muitas de nós por aqui, é transmitido e gera muita visibilidade. Meninas mais novas sabem que podem chegar até aqui porque nós estamos aqui… É o que todos dizem no fim do dia, se você quer alguma coisa, corra atrás. Se você gosta de automobilismo e quer entrar no automobilismo, então o faça. É um mundo muito difícil e você tem que sacrificar muito, não são apenas flores, você precisa trabalhar duro. Mas nunca desista e siga seus sonhos”. - Marta Garcia, primeira campeã da F1 Academy, sobre ser um modelo para as novas gerações.




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